Chove nos Campos de Cachoeira é o primeiro romance de Dalcídio Jurandir. Através dele o autor nos mostra a vida no Extremo-Norte do país. Publicado pela primeira vez em 1941 após vencer o concurso literário "Vecchi-Dom Casmurro" de 1940.
Jurandir é magistral em descrever costumes, hábitos alimentares, a sociedade e os pormenores da paisagem e cultura do povo amazônico. Eu sinceramente penso que todo "filho" desta terra deva ler um livro de Dalcídio Jurandir em algum momento, acho até que seja leitura obrigatória! Aos meus leitores que são de outras regiões desse Brasil tão rico eu sugiro a leitura dos livros de Dalcídio que são uma riqueza a parte e permitem um olhar tão aguçado, real e rico do que ele próprio chamava de "Extemo-Norte".
Edson Pantoja nos diz que: "Gestado e escrito entre 1929 e 1939, período situado entre as duas guerras mundiais, o romance apresenta ao país, num contexto literário nacional marcado pela expressão das regionalidades brasileiras, dramas e expectativas de habitantes da pequena vila de Cachoeira, na Ilha de Marajó (...)" (1)
Assim começa Chove nos Campos de Cachoeira... "Voltou muito cansado. Os campos o levaram para longe. O caroço de tucumã o levará também, aquele caroço que soubera escolher entre muitos no tanque embaixo do chalé. Quando voltou já era bem tarde. A tarde sem chuva em Cachoeira lhe dá um desejo de se embrulhar na rede e ficar sossegado como quem está feliz por esperar a morte. Os campos não voltaram com ele, nem as nuvens nem os passarinhos e os desejos de Alfredo caíram pelo campo como borboletas mortas...(2) Dalcídio nos permite uma leitura completa dos hábitos alimentares da região. É possível inclusive ver costumes vigentes até hoje no Pará. Em uma das cenas, Eutanázio em visita a tia Eponina é convidado a esperar o café com bolacha-maria: "Na visita de Eutanásia a sua tia Eponina, ela tratou de lhe dizer "_ Espera o café com bolacha -maria, Eutanázio". A mesma tia que "Fazia um notável camarão com coco". Assim, "D. Eponina trazia o café co. Bolacha-maria e a mantegueira. O marido de tia Eponina devorava três bolachas duma vez com os olhos no seu carrão de sena que não saía". (3) Eu não sei vocês, mas, eu quando criança adorava um café com Bolacha-maria e entre duas bolachas, imitando um sanduíche muita manteiga. De vez em quando eu gosto de um lanchinho assim, tem gosto de infância. Um outro hábito aparece no livro, o costume de tomar um Caribé, pra dar sustança e ficar bem de saúde. "Veio D. Tomázia olhar na mesma manhã o doente . Era a sua comadre. Foi logo a cozinha fazer um Caribé, mingaus, papas, leite. Era preciso alimentar o doente. (4) Aqui dizem que Caribe levanta "defunto". A alimentação é sua relação direta com o corpo e a saúde. Eutanázio, o doente, não queria saber de comer nem beber nada, D. Amélia sempre tenta fazê-lo comer algo, em outro momento ela diz a Alfredo que: "_Alfredo, Alfredo, diz para ele que lá no armário tem carne assada e arroz e que ficou leite no bule. Pergunta se quer um chá, que vou fazer. Vai dizer logo, anda. Não quis a carne nem o leite. O chá podia ser mas disse a Alberto que és se sentindo bem."(5) Eutanázio era filho de Major Alberto, e sobre esse personagem Dalcídio nos conta que: "_Major Alberto não gosta de café puro nem de leite simples. E sim, café com leite, com mais café que leite. Fica é mais gostoso e eu sei por experiência" Mas, depois da chegada de D. Amélia o "Major Alberto começou a comer uma comida bem feita. Começou a comer de desapertar o cinturão como o Didico (...)Um pirão de batata, um peixe com coco, um peixe desfiado no arroz, uns bolinhos de pirarucu, uma fritada de tambaqui, uns cozidões, uns espernegados. Major Alberto convidava Coronel Bernardo para um Peru, um capão, um Pato do Mato com arroz. Era sempre aos domingos. O vento invadia o chalé. D. Amélia socava o café em mão de pilão e Coronel Bernardo, de costas para a janela, não se continha: _D. Amélia, não há dúvida nenhuma que café torrado em casa é o que se pode chamar um café. Então Major Alberto falava no excesso de maquinismo que havia de acabar com o bom gosto da cozinha, com a delícia dum café socado em casa (...)". (6)
A narrativa nos leva ao encontro de hábitos alimentares tão comuns a região e alguns ancestrais como era o caso do consumo de pato do Mato ou do Caribé, por exemplo. E ainda, pirão de batatas, peixe com coco, peixe desfiado em arroz, os tão apetitosos bolinhos de pirarucu, fritada de tambaqui e cozidões. Na fotografia, uma das habitações do Marajó, nos anos de 1950, os "campos" se fazem presente. Lembrando aqui que alguns destes pratos eram especialidades de domingo. Eu diante dessa "mesa posta" nem sei por onde começaria a me fartar,
🍴🍀🤭
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💬 E você? Qual prato já provou? Qual deste você comeria?
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📚✍🏽 Referências.
Habitações Ilha do Marajó, Pará. Autor: Jablonsky, Tibor; Soares, Lúcio de Castro; Título: Casa principal de uma fazenda na Ilha de Marajó (PA); Ano: 1950
ID 8693. In: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=48693 🔖 Qualquer óbice em relação a imagem por favor nos avisar. Uso educacional.
(1) (2) (3)Jurandir, Dalcídio. Chove nos Campos de Cachoeira. Bragança: Pará.grafo Editora, 2019. p. 13-23; 55.
(4) (5) (6)Jurandir, op. cit., p.82-103-104;100.
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