Eu sempre digo que as práticas alimentares paraense são tão importantes, que elas estão inseridas em nossa literatura, em filmes e na música. Tal realidade demonstra como o nortista está ligado as suas práticas alimentares.
E hoje finalmente eu compartilho o quadro: "Alimentação e Música Paraense". E para inaugurar compartilho a música Pauapixuna, composição de Paulo André e Ruy Barata, interpretada na voz única de Fafa de Belém. A letra é de uma profundidade, de uma beleza lírica que deixa claro o talento gigante de Paulo André e Ruy Barata. Pauapixuna fez parte do segundo LP(1977) de Fafá de Belém, intitulado "Água". Notem a potência de Fafá de Belém, que nos anos de 1977, já estava cantando sobre o Norte, cantando sobre as nossas raízes em rede nacional.
Aliás, "Pauapixuna" foi um sucesso de imediato. Em uma entrevista àquela época, Fafá dizia que Pauapixuna era "de uma força e de uma suavidade ao mesmo tempo. De uma coisa que te pega pelo pé e que de repente toma conta".(1)
Pauapixuna é uma de minhas músicas favoritas,especialmente, porque ela representa tão bem a vida ribeirinha e cabocla e através da letra podemos observar as práticas alimentares paraense. Luciano Silva nos diz que em Pauapixuna: "Há o ato humano de espremer algo e o gosto da pimenta que se mistura aos alimentos, talvez simbolizando o gosto pela pimenta na região amazônica".(2) Uma leitura do autor para o verso "Uma pimenta no prato espremida(...)." E ainda, "Tanto o remar quanto a peixada estão para a região amazônica. Antes, há a atitude de remar em busca do alimento para fazer a janta, a "peixada". "Ar" também rima com "jantar" antes da lambada (gênero musical surgido no Pará, na década de 1970, rindo como base o carimbó é a guitarrada), ações humanas só percebidas metonimicamente ou metaforicamente. E "janta" rimando com "amar", como se constituíssem um campo semântico da fome."(3) A música Pauapixuna é uma obra prima para se pensar as raízes paraenses. Observem a letra a seguir:
"PAUAPIXUNA" (Paulo André e Ruy Barata)
Interprete: Fafá de Belém.
Uma cantiga de amor se mexendo,
Uma tapuia no Porto a cantar,
Um pedacinho de lua nascendo
Uma cachaça de papo pru ar.
Um não sei que de saudade doendo,
Uma saudade sem ou lugar,
Uma saudade querendo, querendo,
Querendo ir e querendo ficar.
Refrão: Uma letra, uma esteira,
uma beira de rio,
Um cavalo no pasto,
Uma egua no cio,
Um princípio de noite,
Um caminho vazio,
Uma leira, uma esteira,
Uma beira de rio.
E no silêncio uma folha caída,
Uma batida de remo a passar,
Um candeeiro de manga comprida,
Um cheiro bom de peixada no ar.
Uma pimenta no prato espremida,
Outra lambada depois do jantar,
Uma viola de corda curtida,
Nesta sofrida sofrência de amar.
Refrão.
E o vento espalhado na capoeira,
A lua na Cuia do bamburral,
A vaca mudando lá na porteira,
E o macho fungando lá no curral.
O tempo tem tempo de tempo ser,
O tempo tem tempo de tempo dar,
Ao tempo da noite que vai correr,
O tempo do dia que vai chegar.
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📚✍🏽 Referências.
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📽 Paisagem Amazônica, 1978. Moacir Andrade. Óleo sobre tela. Canva Equipe. Sidiana Macêdo.
(1) Entrevista Fafá de Belém, LP Água, 1977. Em que ela fala sobre o disco e da música Pauapixuna.
(2)(3)Silva, Luciano Ferreira. Poesia, homem, ambiente e sexualidade em "Pauapixuna " de Ruy Barata e Paulo André. Revista EducAmazonia. Educacao, sociedade e meio ambiente, Humaitá. Ano 9, Vol IX, Número 2, jul-dez, 2017, p. 68;69.
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